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Como é bom tocar um instrumento

Por Luciana Bento

Violão, cavaquinho, flauta, piano, viola, sanfona, violino, sax, bateria, xilofone, cuíca, reco-reco, chocalho, bandolim, pandeiro,  harpa, trompete, trombone, teclado, clarineta, tambor, violoncelo…

As opções são muitas e uma mais interessante que a outra. Cada instrumento tem sua característica, forma, som, personalidade e encantamento únicos. Mas… como escolher um para se dedicar e se relacionar por toda a vida?

Missão aparentemente impossível? Nem tanto. Muitos músicos afirmam que caíram de amores por seus instrumentos e que – embora possam tocar outros – abraçaram com muito prazer o aprendizado e aperfeiçoamento do seu predileto.

A simbiose entre músico e instrumento pode ser tamanha que muitos artistas incorporaram a paixão ao seu nome, tornando-os inseparáveis. Paulinho da Viola, Jackson do Pandeiro, Oswaldinho do Acordeon, Nelson Cavaquinho, Chico Batera, Jacob do Bandolim… Quem nunca se deliciou com o talento destes mestres que fizeram de seus instrumentos uma marca pessoal?

‘’Escolher um instrumento é uma experiência única e com cada um acontece de maneira e idade diferentes. Depende também da oportunidade de acesso tanto ao “mundo da música” de uma maneira geral quanto a um instrumento específico’’, afirma a violinista Andreia Carizzi, do Quarteto Radamés Gnatalli.

‘’A partir daí, são muitos fatores que vão determinar se essa relação será de amor, se será passageira ou se vai durar toda a vida: o estímulo dentro de casa, de professores, motivações externas e internas, uma vontade real de persistir sob qualquer circunstância… Porque nem sempre é fácil, divertido ou prazeroso. É muita dedicação, muita disciplina, como qualquer coisa se quisermos fazer dar certo na vida. Não basta talento’’, explica.

Incentivo de casa não faltou ao músico Marcelo Caldi. Nascido em uma família de pianistas, ele e os irmãos tornaram-se músicos naturalmente, já que o ambiente caseiro era bastante estimulante e favorável. E, embora no início tenha se dedicado ao piano, Caldi caiu de amores mesmo pela… sanfona! (assista a videoaula de Marcelo Caldi aqui).

‘’A sanfona entrou na minha vida na faculdade, quando resolvi montar um grupo de forró com meus amigos’’, conta Caldi. ‘’Depois disso, não parei mais. A sanfona me levou para muitos lugares pois  – mesmo pesando 13 quilos! – dá pra levar pra todo lado’’. Ele conta que no início não imaginava que teria esta relação com a sanfona. ‘’Mas me apaixonei e ela tomou conta da minha vida. Foi inesperado’’, confessa. Com formação clássica, Caldi entrou no universo da música popular pelas mãos da sanfona, conheceu o Nordeste e ‘’ganhou asas pra voar’’, como ele próprio diz.

Hoje ele dirige a Orquestra Sanfonica do Rio de Janeiro, formada por sete sanfoneiros e dois percussionistas. E se engana quem pensa que o repertório se restringe ao forró – embora ele inclua clássicos de Luiz Gonzaga, Sivuca e Jackson do Pandeiro. ‘’A sanfona é muito versátil. Com ela tocamos choro, samba, baião, tango e até peças clássicas, como o célebre Minueto em Sol Maior, de Bach… Não há limites’’, conta.

Instrumento desconhecido

Mas e quando o instrumento é estranho até mesmo para a pessoa que vai tocá-lo? Foi o que aconteceu com a jovem Patrícia Garcia, de dezoito anos, que aos onze se encantou com o oboé – instrumento incomum mas de grande importância em uma orquestra.

‘’Entrei na Casa de Artes de Paquetá aos sete anos e, como a maioria dos alunos, iniciei com a flauta doce, que é uma forma mais simples de ser apresentada ao meio musical. Mas eu queria mesmo tocar violão, que é um instrumento mais popular e conhecido’’, conta Patrícia. ‘’Mas como na época estavam precisando de um oboísta para a orquestra, eu decidi aprender – embora não fizesse a menor ideia de como tocar’’, confessa.

Hoje Patrícia utiliza todo o seu tempo livre para aperfeiçoar seu aprendizado, já que pretende estudar no exterior. ‘’Embora eu tenha escolhido o meu instrumento por impulso, não me arrependi. Eu particularmente acho que o oboé tem um som muito bonito, meio oriental, lembra muito a flauta dos encantadores de serpentes…’’, compara.

A possibilidade de aperfeiçoamento e estudo foi um fator determinante para a escolha de Vitor Hugo, hoje com 24 anos, pela clarineta. Apaixonado desde criança pelo piano, Victor até tentou optar por este instrumento mas a dificuldade de treinar e estudar – já que não tinha um em casa – o fez considerar outra alternativa.

‘Como para você se aperfeiçoar precisa ter contato com o instrumento todos os dias, fiz uma escolha mais consciente pela clarineta. Sempre achei o som muito bonito e ela é versátil, carrego para todos os lugares e posso tocar desde música clássica até jazz’’, conta Victor Hugo, que estuda Música na UFRJ e pretende continuar os estudos fora do Brasil.

Mesmo não tendo sido paixão a primeira vista, ele não parece nem um pouco arrependido da escolha. ‘’Não tenho a menor intenção de trocar de instrumento. Minha relação com a clarineta vai ser longa, permanecerei com ela até uns 70, 80 anos’’, diz, bem-humorado.

Como todas as relações, a rotina entre músicos e seus instrumentos nem sempre é fácil e pode incluir até mesmo ciúme. ‘’Não é só uma questão de ser caro, de ser sensível e delicado, mas de ser um diferente do outro. Não dá pra substituir, cada um é um. E além do som, são obras de arte!’’, confessa Andreia Carizzi, que começou a sua relação com o violino aos 11 anos.

E como precisam permanentemente de cuidados, muitos músicos mantem luthiers de confiança, que cuidam, conservam, consertam e constroem seus instrumentos (conheça mais sobre o ofício do luthier em ‘’Artesão do som”, entrevista com Túlio Lima), já que não é todo mundo que pode manuseá-los.

‘’Eu, por exemplo, tenho um violino feito no Brasil, em 1938, por um italiano, Lo Turco. Não é meu instrumento principal, mas ele é lindo e não empresto pra ninguém, é peça de coleção. Dentro dele, na etiqueta está escrito “nº 64 – Especial”. Então já viu…’’, conta Andreia, contando os segredos desta relação pra lá de especial entre o músico e seu instrumento.

 

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