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Canções que sobrevivem ao tempo

Concerto Didático Brasil de Tuhu – Salvador 2017 | Foto: Taylla de Paula

Por Luciana Bento

“Elas são de fácil assimilação, embora muito elaboradas. Têm letras simples mas cheias de sentido.  São bonitas e, acima de tudo, ligam as pessoas às suas raízes”, resume a professora e musicóloga Ermelinda Paz ao ser perguntada sobre por quê algumas canções atravessam décadas, sobrevivem a modismos, ignoram o tempo.

Autora de 500 canções, bibliografia imprescindível para quem quer se aprofundar no conhecimento sobre o cancioneiro popular brasileiro, Ermelinda é especialista em músicas de tradição oral – ou do folclore, como prefere nomear. “Villa-Lobos foi minha grande inspiração”, conta. “E devo informar que ainda hoje o folclore está vivíssimo, mesmo que em muitos momentos seja apresentado de forma diferente de outras épocas”, diz.

Os exemplos são muitos e vão da Galinha Pintadinha (o desenho usa as melodias das cantigas de roda com outras letras) até composições de músicos consagrados, que bebem na fonte da tradição oral em canções que – também elas – viraram clássicos.

“Procissão”, de Gilberto Gil, “Gato da noite”, de Alceu Valença, “Juazeiro”, de Luiz Gonzaga e “Acalanto”, de Dorival Caymmi… Estas canções são citadas por Ermelinda como exemplos inspirados em clássicos da tradição popular – algumas inclusive usam fragmentos deles em suas letras e melodias.

Passadas de geração para geração, impulsionadas pelo imaginário popular e resistentes a modismos, composições populares – sobretudo as folclóricas – são,  nas avaliação do compositor e produtor cultural Edino Krieger, a matéria-prima prioritária para o trabalho de musicalização infantil.

“Não só por sua beleza musical e simplicidade, mas também porque são fruto de gerações de crianças que se identificam, através dos tempos, com o seu conteúdo poético e cultural”, avalia Krieger, autor de 20 Rondas Musicais – série brasileira de peças de canto coral inspiradas em canções de roda.

Autoria desconhecida?

Mas quem compôs e disseminou estas canções – muitas sequer gravadas à época de sua criação? Não é fácil achar o fio desta meada, já que elas passam de geração a geração, ultrapassam fronteiras, se encontram em outras culturas, sofrem mudanças, abraçam costumes.

Por isso não é raro encontrar versões diferentes das mesmas canções: letras adaptadas, melodias mais ligeiras, nomes diversos… As versões são variadas, dependendo da região do Brasil.

Embora algumas canções de roda – que fizeram a alegria da infância de muitos de nós (e de nossos pais, avós e, quem sabe, bisavós) tenham autoria desconhecida, há clássicos que caíram na boca do povo cujos compositores são conhecidos – embora nem todos saibam quem são.

Quem nunca se deliciou dançando quadrilha ao som de “Olha pro céu, meu amor”? De autoria do mestre Luiz Gonzaga, a música foi gravada no início dos anos 50, final de um rico momento de composição de músicas de festas juninas iniciado na década de 30 – que contou também com canções de Braguinha e Ari Barroso.

Não por coincidência, foi nesta época que Lamartine Babo compôs as também clássicas “Chegou a hora da fogueira” e “Isso é lá com Santo Antônio”, duas das canções mais tocadas em festas juninas brasileiras.

Mas Babo não se ateve às canções juninas. Ele se dedicou ainda à composição de marchinhas de Carnaval e – pasmem – a onze hinos de clubes de futebol do Rio de Janeiro (Flamengo, Vasco, Fluminense, Botafogo, América, Bangu, Madureira, Olaria, Bonsucesso, Canto do Rio e São Cristóvão).

Difícil para o torcedor apaixonado se perguntar, em meio à tensão de um drible e outro, quem é o autor do hino do seu clube. Mas é ou não é um luxo só cantar, com a mão no peito, um hino composto por Lamartine Babo? Ou por Lupicínio Rodrigues, como é o caso do clube gaúcho Grêmio?

“Eu acredito que um clássico surja por uma feliz coincidência entre letra e música boas e o momento histórico e social que a população está vivendo”, avalia o compositor, pianista e arranjador Leandro Braga, responsável pelos arranjos das cantigas do CD Brasil de Tuhu – Volume 1.

O disco, cujas canções são interpretadas por grandes nomes da MPB, é composto por cantigas selecionadas do Guia Prático de Villa-Lobos (coletânea de músicas populares documentadas e rearranjadas pelo maestro nos anos 30). O CD está disponível para download gratuito.

“Veja por exemplo ‘Ô abre alas’, uma das marchinhas de Carnaval mais tocadas de todos os tempos. Muita gente não sabe que ela é de autoria da Chiquinha Gonzaga, mulher que estava ‘abrindo alas’, buscando seu lugar na música, conquistando seu caminho, quebrando regras… Ela falava por muitas mulheres, por um anseio de seu tempo”, aponta Braga, que é arranjador de composições de grandes nomes da MPB, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Tim Maia e Djavan, entre outros.

Ele lembra ainda de “Cidade Maravilhosa” (quem não conhece?), música que virou o hino oficial do Rio de Janeiro em 2003 (ela já era considerada o hino da cidade, mas sem uma lei que formalizasse esta escolha). A canção foi composta por André Filho no início da década de 30, momento em que o Rio recebia a grandiosa estátua do Cristo Redentor e vários trechos da cidade estavam sendo modernizados. Tornou-se um clássico ao refletir uma época em que a autoestima do carioca estava a mil.

Música brasileira, influência multinacional

“Acho de grande importância que o repertório popular nacional seja cultivado em programas de formação e difusão musical, como elemento de afirmação cultural e de resistência à banalidade musical que predomina em nossos meios de comunicação sonora”, sentencia Krieger.

Ele criou sua obra 20 Rondas Infantis ao perceber que a canção utilizada pelos professores de iniciação musical era o Frère Jacques francês. “Pensei então em criar uma série brasileira, que permitisse ao professor introduzir as crianças ao canto polifônico através de cânones brasileiros”, conta.

A visão é compartilhada pela professora Ermelinda Paz: “um país que não preserva sua cultura, suas tradições, sua identidade, é um país fadado a ser subjugado pelo que vem de fora”, sentencia.

O que não quer dizer que as canções populares não tenham profundas (e bem-vindas) influências de outras culturas. “As músicas do folclore brasileiro estão impregnadas de fragmentos das culturas europeias, indígenas, africanas e até mouras”, conta a professora. Uma boa lembrança de que preconceito não combina com qualidade musical.

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